segunda-feira, 26 de março de 2012

A realidade imita a ficção : a primeira reunião dos BRICs


(Fernando Padovani)



         No mês de Junho de 2009 marcado por tantos desequilíbrios climáticos, os presidentes de Brasil, Rússia, Índia e China se reuniram na cidade russa de Ekaterimburgo, simbolicamente situada na fronteira entre Europa e Ásia. Trata-se da primeira iniciativa, no plano dos chefes de governo, no sentido de formalizar uma abstração. As quatro maiores economias emergentes já há algum tempo vem sendo identificadas pela sigla BRIC, representando uma respeitosa somatória. As quatro economias agregam cerca de 15% tanto do PIB mundial como do comércio internacional, e ainda a metade, praticamente, da população do planeta. Entretanto, esse grupo tradicionalmente apresenta poucos interesses comuns para poder ser caracterizado como algo além de uma somatória. 

É exatamente isso que se pretende mudar em Ekaterimburgo. Na pauta efetiva da reunião consta a elaboração de estratégias conjuntas, focadas basicamente em três objetivos de médio prazo: um, a pretensão de maior espaço nas organizações internacionais, especialmente FMI e OMC, dois, a tentativa de construção de mecanismos cambiais que possibilitem o comércio bilateral em moeda local, e três, um melhor posicionamento no tabuleiro político do G-20.


O momento é propício para tais reivindicações por parte destas economias emergentes. A crise financeira de 2008 e a recessão de 2009 aproximaram esses quatro grandes marginais, muito em função do encolhimento do G-7 histórico. Como, em política, espaço abandonado é espaço ocupado, rapidamente forjaram-se entre esses países interesses imediatos, táticos, pontuais e, por isso, provavelmente transitórios, para a atuação coordenada, na forma de grupo. E isto é possível em função da situação atual altamente favorável vivida pelas grandes economias emergentes, que saíram praticamente ilesas da grande crise, sobretudo se considerarmos o tamanho dos problemas enfrentados por EUA, Europa e Japão. O ritmo de entrada de investimentos estrangeiros (IED), a manutenção de elevadas taxas de crescimento na China e na Índia, a relativa estabilidade dos mercados financeiros são elementos que parecem confirmar um certo descolamento. Mesmo no caso da Rússia, a mais impactada das economias, a retomada da escalada do barril de petróleo parece sugerir um horizonte menos cinza.


A aproximação dos países BRIC tem relação direta com a nova conformação do G-7, iniciativa de coordenação de políticas econômicas, agora revista, ampliada e rebatizada como G-20. Tal aproximação visa digerir os resultados da reunião de Londres, realizada no último dia 1º de Abril, e encaminhar a participação coordenada na próxima reunião do G-20, prevista para o final de 2009, na Itália. Muito provavelmente, será no âmbito do G-20 que se apresentará o espaço de negociação para, por exemplo, maior voz e voto dos emergentes no FMI, bem como para propostas mais vantajosas nas negociações da OMC, especialmente aquelas relativas a subsídios agrícolas (na direção da eliminação) e comércio de serviços (na direção da manutenção das restrições).

No que se refere ao FMI, além de oferecer maior participação na constituição dos fundos de socorro no início do ano, o grupo acena a proposta de efetivar o comércio bilateral nas moedas locais. Tendo em vista a extensão das dúvidas e incertezas sobre a sustentabilidade de regimes cambiais bilaterais, a divulgação desta proposta tem sido entendida muito mais como um recurso negocial do que um projeto efetivo. Mesmo em tempos de grande estabilidade inflacionária no plano mundial, os regimes cambiais bilaterais poderiam ser caracterizados como o tipo de mecanismo que “dá certo enquanto tudo está dando certo”, tamanhas as incertezas sobre a sua capacidade de referenciar ajustes externos e garantir reserva de valor e horizontes de estabilidade.

Mais do que um projeto, esta bandeira dos BRIC deve ser entendida como um elemento de pressão, mesmo que difuso, sinalizando a possibilidade de encolhimento adicional da participação do dólar americano como moeda internacional, já diminuída com a maior utilização do Euro e Libra. Caso implementado o comércio em moeda local, isso representaria uma ameaça, pelo menos conceitualmente, de uma eventual não participação nas transações da zona-BRIC. Embora muitos duvidem que tal “bilateralização” do sistema monetário seja minimamente sustentável, sem o patrocínio de uma grande potência ou de uma ampla arquitetura monetária, que aí sim garantiria algum grau de conversibilidade para moedas que não são conversíveis, o que parece pretender o grupo de Ekaterimburgo é semear o debate, para poder, mais tarde, negociar a sua retirada em troca de voz e voto no FMI.


Mesmo porque, a proposta de uma economia mundial sem dólar no curto e médio prazo desinteressa totalmente à China, que, como é amplamente dito e sabido, possui grande parte de sua poupança externa aplicada em títulos remunerados em dólar americano. Reforçar a tendência de encolhimento do dólar na economia mundial poderá vir a representar uma corrosão do valor de suas próprias aplicações internacionais.


Mas esta insistência no tema é compreensível, em função da proposta de reforma do sistema monetário internacional, bem como de suas instituições, ter sido discretamente empurrada para a gaveta por ocasião da última reunião do G-20, em Londres. Numa reunião de tão poucos consensos como também de medidas relevantes, a reivindicação ali trazida especificamente pelos BRIC foi reagendada de maneira unânime pela chamada aliança atlântica.

As perspectivas da primeira reunião oficial dos BRIC parecem, assim, minimalistas. Como grupo efetivo e duradouro, os interesses díspares de seus membros fazem com que os pisos e tetos pareçam muito difusos. Parece haver muito pouco espaço para institucionalização de algum tipo de bloco, em que pese o fato de que apenas colocar o processo institucional em marcha já represente normalmente um importante fator de continuidade. Mas não é desprezível, para efeito de composição de ações coordenadas, o fato de que, no mesmo grupo, alinhem exportadores de manufaturas (China), exportadores de serviços (Índia), exportadores de minérios (Rússia) e exportadores de agrícolas (Brasil). Ali também estão grandes exportadores ao lado de grandes importadores de alimento. Lado a lado estão economias com grandes mercados financeiros (como é o caso do Brasil) e economias com praças pequenas e fechadas.

Mas, como os Estados não têm amizades, apenas têm interesses, como se costuma dizer, os estrategistas de Medvedev, Hu-Jin-tao, Manmohan Singh e Luís Lula devem aproveitar a janela de pragmatismo para compor posicionamentos pontualmente comuns, orientados, por enquanto, apenas para a próxima reunião do G-20. É que as perspectivas longas são inapelavelmente limitadas pelos grandes Urais, lá no horizonte de Ekaterimburgo.

sexta-feira, 23 de março de 2012

como construir uma análise de conjuntura internacional



1. identificar e explicitar o tema 
   (quando, quem, quando ?)

e delimitar o problema 
   (definir nível de análise, federal, municipal, regional,   empresas, sociedade civil, etc.)

2. antecedentes e contexto
   (qual o ambiente e condicionantes externos, jurídico, econômico)

3. lançar hipótese explicativa preliminar

4. indicar os eventuais efeitos e impactos sobre o meio internacional
    (tensão, equilíbrio, desequilíbrio, convergência, melhoria de   governabilidade....)


5. avaliar (para cada país) seus desafios, oportunidades, ameaças e objetivos estratégicos...


6. indicar evolução provável e justificar....



análise com foco em temas de RI:

alguns possíveis objetos típicos de RI (o que analisar)

que podem ser focados e analisados...

a) cooperação
   (acordos, cooperação, acordos, coordenação de ações, relações com vizinhos)

b) conflito
   (tensão, rivalidade, disputas....)

c) poder
   (relações políticas envolvidas, aspectos estratégicos, militares ou de segurança...)

d) economia
   (rels. econômicas, como comércio e finanças internacionais, questões de câmbio....)

e) integração regional
   (relação frente a blocos regionais)

f) organizações internacionais
   (relações com organizações locais ou globais, ONU, FMI, OMC, OEA, etc.)

g) opinião pública
   (imaginário coletivo, sociedade civil, ONGs, meio-ambiente, cultura, etnias, religiões....)

h) relações com o sistema mundial
   (equilíbrio internacional, relações com EUA, China....)