segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Índia e a guerra mundial da Manga

( Carina Zabaleta )

     A economia da Índia é a 10º maior economia do mundo. O PIB do país, em 2007, chegou à casa dos U$800 bilhões, com um crescimento de 8% em relação ao ano anterior. Sua economia é a 2ª que mais cresce no mundo, e o setor agrícola e de mineração também tem contribuído para esse crescimento econômico, ao lado do performante setor de tecnologia de informação. A Índia é uma das maiores produtoras de produtos agrícolas em todo o mundo, com destaque para a produção de cereais, frutas e pesca. No quesito “frutas”, o país é o segundo maior produtor mundial, sendo responsável por 11% da produção mundial de frutas. O que nos faz perceber tamanha importância da fruticultura para a Índia, principalmente por que essa prática é responsável por 17% da composição do PIB agrícola do país.

Do conjunto de frutas atualmente comercializado, a manga indiana é uma das mais populares no mundo, em função do seu amplo consumo nos países Asiáticos e da América Latina. Ela é cultivada em 85 países, sendo a Índia o principal produtor com 50 % da produção mundial total, mas apenas o quarto maior exportador (FAO 2000). Mesmo assim, o maior mercado consumidor é o próprio mercado doméstico indiano, uma vez que a exportação representa cerca de 2% da produção total. No ano de 1998, as exportações indianas de manga totalizaram meio milhão de toneladas, diante de uma produção total de 24 milhões de toneladas. Este fato demonstra que quase toda a produção ainda é destinada ao mercado interno. Os principais mercados de destino para a manga indiana são os Emirados Árabes Unidos, os Estados Unidos e a China.

O mercado internacional da manga é dominado pelo México, o principal exportador e responsável, em 1998, por 41 % das exportações mundiais, que atingiram 510 milhões de toneladas. Os demais grandes exportadores de manga são as Filipinas com 10 %, o Brasil, com 8%; a Índia 6% e a Holanda com 3%. Observa-se que os três principais produtores vêm tendo uma participação cada vez maior nos últimos anos, ao passo que a Índia, que é responsável por 50% da produção mundial de manga não se destaca como um grande exportador.

Como em qualquer outro segmento agrícola, os preços são um reflexo direto da oferta internacional. No caso da manga, a demanda internacional também tem aumentado, como em outros segmentos da produção agrícola, e os preços da manga tem aumentado, crescendo 24% entre 1990 e 1999. Paralelamente, a oferta mundial de manga tem sido beneficiada pela significativa redução de barreiras tarifárias. Entretanto, a aumento de barreiras não tarifárias, especialmente de barreiras fitossanitárias, sobretudo estipuladas pelos países de maior renda per capita, tem se disseminado.

No caso da manga indiana, a principal barreira são as exigências relacionadas com o aspecto fitossanitário, como as regras de inspeção na origem estipuladas por China e Coréia do Sul, bem como de outros procedimentos de certificação sanitária e de qualidade, além de outras exigências relativas à embalagem. Como a manga é uma fruta tropical e os grandes importadores de frutas são na sua grande maioria países desenvolvidos de clima temperado e com mercados altamente exigentes na qualidade e segurança dos alimentos, se torna alto o custo de produzir e enviar mangas para estes compradores. Isso acaba tornando a manga um produto caro e relativamente de luxo nestes mercados.

A posição indiana tem sido um fator importante na OMC para a melhoria das condições de comercialização internacional, negociadas no quadro da OMC. A Índia, ao lado de outros países produtores, pressionou pela não inclusão de alguns temas considerados sensíveis, foi fundamental na atuação da coalizão do Acordo sobre aspectos dos Direitos da Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (TRIPS, sigla em inglês) e Saúde Pública (em conjunto com Brasil e África do Sul) e como fonte de pressão pela coalizão do Like Minded Group, em que foi líder. Todos esses movimentos foram importantes para que países emergentes tivessem parte de suas demandas incorporadas no documento de lançamento da Rodada Doha.

No caso da Índia, ela tem demonstrado grande resistência em abrir o seu mercado agrícola, ainda que demande abertura de mercado e fim dos subsídios às exportações por parte dos países desenvolvidos. O país também defende tratamento especial e diferenciado para países em desenvolvimento (PED), além da possibilidade do estabelecimento de mecanismos de salvaguardas especiais para produtos agrícolas. As propostas da Índia argumentam que a proteção de seu mercado agrícola justifica-se em função do papel fundamental desempenhado por ele no equilíbrio e no desenvolvimento da sociedade indiana. A grande maioria dos indianos obtém sua renda direta ou indiretamente da agricultura e, apesar de representar menos de um quarto do PIB, o setor é uma fonte importante de emprego e renda para parcela significativa da população. Os negociadores indianos negam-se a expor sua enorme população rural (70% do total, ou seja 700 milhões de pessoas) às flutuações do mercado internacional e aos subsídios agrícolas distorsivos dos países ricos. Há certa percepção, entre setores importantes da sociedade e das elites, de que o sistema multilateral de comércio apresenta desequilíbrios que prejudicam os PED.

A atuação da Índia tem buscado, assim, tornar os acordos da OMC mais permeáveis a suas preferências ou, no mínimo, não contrários a seus interesses. Embora isso possa ser inerente a todos os Estados, a posição indiana estrutura-se a partir de especificidades domésticas e internacionais que ajudam a entender a sua operacionalização. O papel de empreendedor político desempenhado em coalizões de PEDs, assim como a maior integração das posições do país com as preferências domésticas e a participação pró-ativa, no conjunto das negociações, são aspectos importantes do processo de fortalecimento das posições da Índia na OMC, entendidas como desfavoráveis a seus interesses.

Sem contar o fato de que a Índia faz parte de um grande bloco econômico que, agora mais do que nunca, é um dos mais importantes da OMC, pois trata-se do bloco dos PEDs, os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul).

Nenhum comentário:

Postar um comentário